sábado, 28 de novembro de 2009

A violência domestica


Apesar de ter sempre à mão um varão onde pendurar as toalhas molhadas, de vez em quando ainda há coisas que me fazem ir aos arames. No passado dia 25 de Novembro assinalou-se o Dia Internacional pela Eliminação da Violência contra a Mulher e, pelos vistos, tem sido assim todos os anos desde 1981. Sinceramente não sabia que isto se estava a passar, deparei-me ontem por mero acaso com uma notícia que o mencionava enquanto procurava vídeos de violação na net que não fossem flagrantemente encenados ou cuja estrela a ser estuprada não fosse um estafermo qualquer das Filipinas com buço e quase com idade para ter o período que devia era ficar agradecida de alguém lhe cuspir para cima meramente como um meio e não como um fim em si. Na minha inocência, pensei de início que se tratava só de mais uma piada da ONU, como o Dia Mundial da Meteorologia (23 de Março) ou o Dia Mundial da População (11 de Julho, que sempre achei particularmente engraçado por ser, de certa forma, um dia que celebra a sua própria condição de possibilidade). Mas não. Página após página, link após link, cada vez mais me ia apercebendo de que toda a gente estava mesmo a levar aquilo a sério. Não é brincadeira, existe mesmo um Dia Internacional dedicado à eliminação da sova feminina.

O que me espanta é não ver ninguém a fazer barulho. Ninguém se insurge, ninguém diz nada, ninguém faz nada... Como pode ser isto? Como é possível que tantos protestem em defesa da riqueza cultural associada às tradições de maltratar touros e ninguém se erga em defesa da não menos milenar e venerável tradição de maltratar vacas? Todos sabemos bem porquê. A razão é que as ideias propostas na ONU para a criação de novos dias internacionais disto e daquilo podem agora sair de bocas que pouco tempo antes estavam de batom esborratado até às bochechas ocupadas a absorver as gaitas dos mesmos vetustos senhores que ouvem e aprovam essas ideias em respeitável assembleia. Sim, porque não podem haver dúvidas de que a ideia do mencionado Dia foi de uma ponta à outra cozinhada em cabecinhas femininas que nunca deviam ter saído da cozinha logo para começar. E que assim foi é fácil de provar. Considerem alguns exemplos de outros Dias: Dia Mundial da Água, Dia Mundial da Saúde, Dia Mundial do Refugiado. Nomes curtos e simples, criados por mentes objectivas e concisas – leia-se “masculinas”. Qual o resultado do mesmo esforço intelectual realizado por mulheres? O “Dia Internacional pela Eliminação da Violência contra a Mulher”. Habituadas que estão a ter as goelas cheias de pénis pensam que é fácil para um homem dizer isto tudo num só fôlego sem se engasgar.
Mas até nem seria assim tão grave se fosse só isso. O problema é que nem conseguem decidir de uma vez por todas como se chama mesmo a porra do dia afinal! Uma pesquisa no Google devolve as seguintes designações para o mesmo dia, a acrescer à que já mencionei: “Dia Internacional da Eliminação da Violência Contra a Mulher”; “Dia Internacional da Não-Violência contra as Mulheres”, “Dia Internacional Contra a Violência Contra as Mulheres (esta pérola está no site da APAV, esse ninho de ratas)”; “Dia Internacional pela Eliminação de Todas as Formas de Violência Contra as Mulheres”, e por aí adiante, com várias variações. E não se pense que é um problema de tradução porque em inglês é mais do mesmo, reflectindo claramente que na ONU, como no resto do mundo, o adágio aplica-se com igual propriedade: “Onde há três mulheres, há quatro opiniões”.

À súbita onda de solidariedade para com a mulherada acresce o facto de cada vez serem mais os homens a terem de se justificar perante um(a) juiz(a) pelas merecidas pancadas que administram às respectivas esposas e namoradas, como se fossem criminosos. A APAV acusa um aumento dos “crimes” deste tipo e, como resultado, cada vez há mais homens com medo de espancarem quem há muito anda a pedi-las porque, ao contrário destas últimas, não têm nenhuma associação que proteja o seu direito a dar-lhes forte e feio quando os limites da paciência são largamente ultrapassados. Pois bem, isso tem de mudar, e Príapo vai dar o primeiro passo nesse sentido.

Primeiro que tudo há que dizer que a mulher, por natureza, precisa de levar porrada. Tal como o leão de circo, é necessário quebrar-lhe o espírito com umas vergastadas valentes naquele lombo nos bastidores para que mais tarde, em público, seja obediente e nem sequer lhe passe pela cabeça ser espontânea (ainda que, no fim do dia, se lhe dê em recompensa um bocado de carne para abocanhar). É esse o simples facto da vida que serve de título a este post e que convém nunca esquecer: a mulher tem que ser domesticada e a violência domestica, algo que elas próprias reconheceriam se fossem capazes de raciocínio lógico, porque – não duvidem – os homens dividem-se entre os que batem nas mulheres e os que gostariam de bater, ao passo que as mulheres pertencem todas ao mesmo grupo: as que merecem levar. “Oh, o meu namorado não, é um cavalheiro, um tipo fantástico, ele nunca me bateria”. Acham que sim? Acham mesmo que o vosso namorado é mais fantástico do que o próprio Sr. Fantástico, do Quarteto com o mesmo nome?

Ponto assente: elas nunca o admitirão mas é preciso arrear-lhes. Porém, não pode ser de qualquer maneira, à trolha. A maquilhagem L’Oréal da imagem acima dá prisão e isso é que não pode ser. O que fazer, então? Bom, há importantes lições a aprender com os nossos irmãos muçulmanos a esse respeito, se substituirmos todas as ocorrências de “Alá” por “Polícia” no seu pensamento. Mas como o que eles dizem por si só não oferece verdadeiramente um método, ficam aqui 10 dicas para que possam sovar as vossas gajas com alegria e tranquilidade, como sempre devia ser, sem deixarem marcas visíveis:

1) Puxar os cabelos com força é sempre bom, desde que se deixem ficar alguns.
2) Se ela estiver maquilhada limpe-lhe as trombas primeiro. Uma mulher que vai levar uma tareia vai chorar de certeza e todos os anúncios contra a violência doméstica ostentam a imagem de uma dessas mulas com cara de Joker. Se ela for para a rua assim e não estiver a chover, é cadeia garantida.
3) Nunca bater nas duas mamas na mesma sova, mas sempre numa só. Isto porque uma mama que leve um soco geralmente incha. Ora, mesmo que fique negra, a mulher vai ter vergonha de mostrá-la às autoridades porque podem não acreditar que ela tem as mamas desniveladas só por causa do soco, e podem até achar que aquilo já era assim antes. Logo, afinfe-lhe na teta repetidamente a gosto, procurando desfrutar. Tempere com insultos da estação.
4) Bater na cara só à chapada, nunca com sopapos, e convém não apanhar as ventas em cheio porque deixa marcas suspeitas. O ideal é apanhar a bochecha a meio e um bocado da orelha, não só porque não deixa vermelhidão mas também porque o impacto afecta o ouvido interno, ligado ao equilíbrio, e faz a mulher cair desorientada em sublime silêncio. Uma boa maneira de recordar esta regra no calor da sova é pensar na mulher sempre como a “cara-metade”.
5) Se a mulher tiver brincos não convém usar a técnica anterior, porque pode fazer ferida e se assim for o agressor inocente pode acabar na cadeia a ser enrabado. Nesses casos, dê-lhe um soco no estômago (nunca nas costelas), e um chuto no cu quando ela se dobrar aos vómitos. Importante: o chuto nunca deve ser de biqueira, mas com o peito do pé. Quando aplicar, imagine que faz um passe alto.
6) Se ela já estiver no chão, aplique-lhe alguns dos mencionados chutos na barriga e termine com um centro à Figo mesmo na pachacha. Repetir até à inconsciência.
7) No caso de ela estar grávida nunca lhe bata na barriga porque um aborto dá nas vistas. Porém, ameace fazê-lo. Ela tentará a todo o custo proteger o feto e deixar-lhe-á o caminho livre para praticar as técnicas 1), 3) e 4) sem restrições. Aproveite também para lhe pisar os pés com vigor. A acumulação de líquidos nas pernas no tempo de gravidez dificulta a formação de nódoas negras e causa também mais dor, o que faz deste um excelente método para disciplinar a prenhe desobediente.
8) No caso de praticar a violência doméstica todos os dias procure inovar nas técnicas de agressão bárbara a que recorre, de modo a que a vida de casal não entre na rotina. Não tenha vergonha de perguntar à sua parceira quais ela prefere.
9) Se quiser usar um objecto, opte por uma mala de laptop com este lá dentro. A pega torna este objecto prático e a almofadagem interior impede a formação de hematomas na vítima. Caso o laptop se parta durante a agressão, retire-lhe a memória com algumas pancadas de lado e mande arranjar o resto. O laptop, por outro lado, dificilmente terá arranjo.
10) No fim, por via das dúvidas, deve dizer à mulher que a ama e que nunca mais voltará a bater-lhe. Minta a gosto até à persuasão.

Espero que possa ser útil. Se apenas uma mulher for dolorosamente espancada em consequência deste post, escapando impune o seu heróico agressor, considerarei a minha missão cumprida.

quarta-feira, 25 de novembro de 2009

Entrevista Post-Mortem: Robert Enke

Após várias tentativas de entrar em contacto com o seu agente (funerário), o Filósofo Priapista conseguiu finalmente agendar uma entrevista exclusiva com Robert Enke, o famigerado guarda-redes que faleceu no passado dia 10 de Novembro e foi a enterrar cinco dias depois. O encontro ficou marcado para hoje de manhã num café em Lisboa. Enke apareceu a horas e bem vivaço, apesar da chuva. Segue-se a transcrição da conversa que tivemos, traduzida do alemão vernáculo:

Príapo: Exacto, exacto. Olha, é o país que temos.
Enke: Pois. Mas deixa lá que não é só em Portugal que é assim. Na Alemanha é a mesma merda.
P.: Bom, mudemos de assunto. Não te avisei mas a entrevista já começou, desculpa lá. Robert Enke, antes de mais queria agradecer-te teres dispensado alguns momentos do teu descanso eterno para esta entrevista exclusiva. Como sabes, sou um admirador. É com grande prazer que estou aqui contigo hoje.
E.: Obrigado, caríssimo Príapo. Também é um grande prazer para mim estar aqui hoje, ainda que apenas em parte, dado que só parte de mim está efectivamente aqui.
P.: Sim, não pude deixar de notar que os teus braços e pernas estão ausentes.
E.: É um facto. Infelizmente, depois do impacto do comboio nunca mais foram vistos. Mas as buscas continuam, há terraços ainda por investigar.
P.: Bem, fora isso aparentas estar em boa forma.
E.: Sim, aparte do rabo assado por ter sido arrastado vários metros à frente do comboio sobre tábuas transversais de madeira cheia de farpas até estou bem. De qualquer modo não é assim tão mau ter perdido os membros. Aliás, conto voltar ao trabalho quando já estiver mais recuperado. Talvez já não para o futebol porque agora era complicado mas uma carreira de guarda-redes de hockey não está fora de questão. Afinal, a baliza sempre é mais baixinha.
P.: *risos* Folgo em saber que estás bem disposto, Enke. Concordo plenamente com o que dizes. Eu próprio sou a prova viva de que o que faz um homem não são os membros, mas o tronco.
E.: Pois. Eu neste momento sou só a prova.
P.: E como tem a vida depois de morto?
E.: Olha, Príapo, tem sido melhor do que antes. De início foi complicado, custou-me a aceitar certos aspectos do processo de putrefacção, que é desagradável, mas recebi bastante apoio do Michael Jackson nesse aspecto. Ele já lida com o mesmo problema há décadas portanto pôde recomendar-me uns cremes e afins.
P.: Ah, conheceste o Michael?
E.: Sim, ficámos imediatamente amigos. Temos alguma afinidade, ele também teve um passado negro.
P.: Como se conheceram?
E.: Através da minha filha.
P.: Ah, é verdade, agora depois de morto pudeste reunir-te a ela. Como foi isso?
E.: Posso apenas dizer-te que foi uma sensação inexplicável. Bem... inexistente, na verdade, visto que estou morto e os mortos não sentem nada, mas imagino que teria sido extraordinária se a tivesse sentido. Já anda na escola a miúda, e até já sabe ler, vê lá! Ajudei-a recentemente a redigir a sua primeira composição.
P.: A sério? E foi sobre o quê?
E.: Sobre decomposição, curiosamente.
P.: E ainda ontem era uma bebé de colo…
E.: É verdade. Nós que somos os pais não notamos mas nestas idades apodrecem a uma velocidade incrível. Qualquer dia já é uma mulher. Ou várias, sabe-se lá, a matéria que nos forma dá muitas voltas depois de se tornar adubo.
P.: Vê-se que se ainda tivesses glândulas salivares funcionais serias um pai babado.
E.: Sem dúvida. Tenho muita sorte, é uma miúda impecável. Anda sempre na linha. Olha, nesse aspecto sai ao pai *risos*.
P.: *risos* Ai, ai, Enke, essas tuas piadas secas…
E.: É verdade, é verdade. O humor sempre me esteve no sangue, sabes. Já o meu pai estava sempre na tremalhonguice, era risota constante ao pé dele. Mas claro, quando o meu sangue secou, as minhas piadas também.
P.: Muito bem. Enke, não te prendo mais, mesmo porque imagino que esteja na hora de ires ajudar a tua filhinha a fazer os trabalhos de cripta. Só mais uma questão: há alguma coisa em particular que tenhas aprendido entre os mortos que queiras contar aos nossos leitores?
E.: Não sei, perdi muita mioleira no acidente.
P.: Olha que não se nota nada.
E.: Naturalmente. Sou futebolista.
P.: És o maior. Senhoras e senhores, connosco esteve Robert Enke. Obrigado, Enke. Apertava-te a mão mas não tens nenhuma.
E.: Deixa lá isso. Peço-te apenas que me metas num saco e me atires ao Tejo antes da hora do almoço, senão perco a corrente e só consigo voltar para casa amanhã de manhã.
P.: Enke… Será uma honra.

terça-feira, 24 de novembro de 2009

Ejaculação Inaugural

Ao leitor transeunte,

Quer tenha vindo parar a este blog por lapso enquanto embrenhado numa qualquer pesquisa virtual doentia, quer por outro motivo obscuro que agora também não interessa, imagino que não possa deixar de se sentir ultrajado por se ter encontrado inadvertidamente diante da enorme vergasta que brota do baixo-ventre do indivíduo representado na imagem acima, no estilo típico de uma época em que ainda ninguém desenhava muito bem. Para mais, ainda se viu confrontado com a estupidez aparente que é associar de algum modo o priapismo – essa paradoxal doença de grande gravidade que, simultaneamente, a desafia – à Filosofia – suprema actividade do espírito humano, associada mais à edificação do que à erecção, de tal modo que já não haveria hoje espíritos humanos a edificar se o número de filósofos existentes a qualquer momento da História não se restringisse sempre a uma reduzida percentagem da população, curiosamente comparável à dos que sofrem de priapismo. Portanto, não me sentiria bem nem conseguiria dormir descansado hoje se não explicasse que porra vem a ser esta. Primeiro, um pouco de cultura histórica:

Ensina-nos a Encyclopaedia Britannica que Príapo era um deus da fertilidade animal e vegetal, cujo culto originou no Helesponto (actual Estreito de Dardanelos, na Turquia), tendo-se espalhado a partir daí para o resto do mundo. Não obstante a forma terrena desta peculiar divindade ser humana, era facilmente identificável entre a multidão por ostentar um barrote permanentemente entesado do tamanho de um monovolume de dois lugares. Na versão grega da história, os seus pais eram, como não podia deixar de ser, Dioniso (o deus da bebedeira) e Afrodite (a deusa de fazer o amor). O animal que se costumava sacrificar em sua honra era o burro, e de modo a que fiquem esclarecidos todos aqueles que se questionarem quanto ao motivo por que assim era, cito directamente a Encyclopaedia Britannica: “The ass was sacrificed in his honour […]”.

Segundo, um pouco de cultura científica:

De acordo com a autoridade da revista Caras, o priapismo caracteriza-se por uma dolorosa erecção peniana que se prolonga por mais de 6 horas, e que pode afectar qualquer um, mesmo crianças e anões, sendo nestes dois últimos casos bastante mais grave mas também bastante mais engraçado. Se não for tratado depressa, o priapismo pode degenerar em impotência crónica e, caso persista por mais do que cinco dias, pode mesmo levar à morte ou, pior, à necessidade de se capar o mastro. Nestes casos, o falo amputado costuma ser substituído por uma prótese peniana, após o que o prazer do acto sexual se torna comparável ao de ouvir alguém contar como foi.

Para a mente clarividente que lê estas palavras, então, não poderá deixar de ser revelado em toda a sua magnificência o facto de que a vida não é ela própria mais do que priapismo: dolorosa, potencialmente fatal, mas ao mesmo tempo uma sorte do caraças quando acontece porque calha a poucos e enquanto dura há que aproveitar. Eis aqui encapsulado o fundamento do Priapismo enquanto corrente filosófica, da qual este blog representa a alvorada, acompanhada de respectiva tesão matinal.

Mas que o leitor não se deixe seduzir pela subtileza desta observação existencial. Toda a profundidade e sobriedade cessam aqui. Aliás, estou a tratar-te por “você” desde o início nem sei porquê. A verdade é que serão aqui escritas coisas que irão ofender, coisas desnecessárias e de gosto questionável quando não flagrantemente mau. Raras vezes se lerá aqui alguma coisa de jeito e, nos casos em que tal acontecer, peço apenas que me avisem para que não se repita.

Ora, de modo a que se inaugure desde já a falta de educação, apresento-me no fim. Sou o Filósofo Priapista, ou simplesmente Príapo, o anónimo e bem vestido, que talvez um dia venha a responder ao teu súbito olhar de assombro com um sorriso misterioso, num comboio cheio, se encostares muito o carrinho à praça. Ou talvez não. Seja como for, onde houver uma tesão, desconfia.