quarta-feira, 25 de novembro de 2009

Entrevista Post-Mortem: Robert Enke

Após várias tentativas de entrar em contacto com o seu agente (funerário), o Filósofo Priapista conseguiu finalmente agendar uma entrevista exclusiva com Robert Enke, o famigerado guarda-redes que faleceu no passado dia 10 de Novembro e foi a enterrar cinco dias depois. O encontro ficou marcado para hoje de manhã num café em Lisboa. Enke apareceu a horas e bem vivaço, apesar da chuva. Segue-se a transcrição da conversa que tivemos, traduzida do alemão vernáculo:

Príapo: Exacto, exacto. Olha, é o país que temos.
Enke: Pois. Mas deixa lá que não é só em Portugal que é assim. Na Alemanha é a mesma merda.
P.: Bom, mudemos de assunto. Não te avisei mas a entrevista já começou, desculpa lá. Robert Enke, antes de mais queria agradecer-te teres dispensado alguns momentos do teu descanso eterno para esta entrevista exclusiva. Como sabes, sou um admirador. É com grande prazer que estou aqui contigo hoje.
E.: Obrigado, caríssimo Príapo. Também é um grande prazer para mim estar aqui hoje, ainda que apenas em parte, dado que só parte de mim está efectivamente aqui.
P.: Sim, não pude deixar de notar que os teus braços e pernas estão ausentes.
E.: É um facto. Infelizmente, depois do impacto do comboio nunca mais foram vistos. Mas as buscas continuam, há terraços ainda por investigar.
P.: Bem, fora isso aparentas estar em boa forma.
E.: Sim, aparte do rabo assado por ter sido arrastado vários metros à frente do comboio sobre tábuas transversais de madeira cheia de farpas até estou bem. De qualquer modo não é assim tão mau ter perdido os membros. Aliás, conto voltar ao trabalho quando já estiver mais recuperado. Talvez já não para o futebol porque agora era complicado mas uma carreira de guarda-redes de hockey não está fora de questão. Afinal, a baliza sempre é mais baixinha.
P.: *risos* Folgo em saber que estás bem disposto, Enke. Concordo plenamente com o que dizes. Eu próprio sou a prova viva de que o que faz um homem não são os membros, mas o tronco.
E.: Pois. Eu neste momento sou só a prova.
P.: E como tem a vida depois de morto?
E.: Olha, Príapo, tem sido melhor do que antes. De início foi complicado, custou-me a aceitar certos aspectos do processo de putrefacção, que é desagradável, mas recebi bastante apoio do Michael Jackson nesse aspecto. Ele já lida com o mesmo problema há décadas portanto pôde recomendar-me uns cremes e afins.
P.: Ah, conheceste o Michael?
E.: Sim, ficámos imediatamente amigos. Temos alguma afinidade, ele também teve um passado negro.
P.: Como se conheceram?
E.: Através da minha filha.
P.: Ah, é verdade, agora depois de morto pudeste reunir-te a ela. Como foi isso?
E.: Posso apenas dizer-te que foi uma sensação inexplicável. Bem... inexistente, na verdade, visto que estou morto e os mortos não sentem nada, mas imagino que teria sido extraordinária se a tivesse sentido. Já anda na escola a miúda, e até já sabe ler, vê lá! Ajudei-a recentemente a redigir a sua primeira composição.
P.: A sério? E foi sobre o quê?
E.: Sobre decomposição, curiosamente.
P.: E ainda ontem era uma bebé de colo…
E.: É verdade. Nós que somos os pais não notamos mas nestas idades apodrecem a uma velocidade incrível. Qualquer dia já é uma mulher. Ou várias, sabe-se lá, a matéria que nos forma dá muitas voltas depois de se tornar adubo.
P.: Vê-se que se ainda tivesses glândulas salivares funcionais serias um pai babado.
E.: Sem dúvida. Tenho muita sorte, é uma miúda impecável. Anda sempre na linha. Olha, nesse aspecto sai ao pai *risos*.
P.: *risos* Ai, ai, Enke, essas tuas piadas secas…
E.: É verdade, é verdade. O humor sempre me esteve no sangue, sabes. Já o meu pai estava sempre na tremalhonguice, era risota constante ao pé dele. Mas claro, quando o meu sangue secou, as minhas piadas também.
P.: Muito bem. Enke, não te prendo mais, mesmo porque imagino que esteja na hora de ires ajudar a tua filhinha a fazer os trabalhos de cripta. Só mais uma questão: há alguma coisa em particular que tenhas aprendido entre os mortos que queiras contar aos nossos leitores?
E.: Não sei, perdi muita mioleira no acidente.
P.: Olha que não se nota nada.
E.: Naturalmente. Sou futebolista.
P.: És o maior. Senhoras e senhores, connosco esteve Robert Enke. Obrigado, Enke. Apertava-te a mão mas não tens nenhuma.
E.: Deixa lá isso. Peço-te apenas que me metas num saco e me atires ao Tejo antes da hora do almoço, senão perco a corrente e só consigo voltar para casa amanhã de manhã.
P.: Enke… Será uma honra.

6 comentários:

  1. Isso é um pouco como dizer "a partir de AGORA, não digo mais nada".

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  2. I've read some nastyass shit in my time, but this...

    Ri-me bué e no fim senti-me mal. Agora já passou.

    Desafio-te a escrever qualquer coisa de pior gosto ainda

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  3. um blogzinho de merda desses. o que podemos esperar ?
    que um trem atropele o dono.

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